Falar em História enquanto conhecimento nos dias de hoje é ampliar o horizonte. Dentro desta concepção epistemológica, diríamos mesmo, é dar sentido à trajetória que cada um tem ao conduzir seus passos no caminho da vida.
De longa data se discute a profissionalização
da atividade do Historiador e atrelada a ela está à própria história, buscando
seu status de conhecimento cientificamente conduzido.
A “mãe”
do conhecimento passa a ser filha de seu próprio dever.
Conceituar alguém
como historiador é imputar-lhe um peso sobre o desdobramento dos acontecimentos, como se este fosse responsável por sua realização. Por outro lado é
conferir-lhe um caráter amplo de conhecimento no campo da heurística, fazendo
dele a base de um processo amplo de compreensão.
O historiador deve ter em mente (a verdade) que seu ofício
prima pela explicação, complexidade da ação humana.
Possuir o título de Historiador nem sempre fundamenta a ação, mas confere status de apropriação sobre o acontecimento histórico.
Possuir o título de Historiador nem sempre fundamenta a ação, mas confere status de apropriação sobre o acontecimento histórico.
Cabe lembrar também que se a academia propõe
a formação do historiador e do professor de história. Por outro lado isto só se
tornou efetivo porque tantos outros foram apaixonados pelo conhecimento da
história e quiseram registrar os feitos humanos a partir de suas concepções
particulares de método.
Alguns pomposamente acadêmicos, outros
professores de história, mas historiadores em suas práticas.
Dentre estes
gostaria de lembrar uma historiadora curitibana em especial, a saudosa Maria
Nicolas, professora das primeiras letras, poeta sobre as ruas de Curitiba que
em sua coragem de pesquisadora fez jus ao título de historiadora municipal. Quantas vezes a secção de documentação paranaense da Biblioteca Pública do
Paraná teve o prazer de sua presença quase anônima, por vezes tímida, mas
indubitavelmente efetiva num ofício tão próprio. Num tempo em que se anotava a
mão a maioria das coisas importantes que se lia, em dedos que formaram calos ao
escrever. Assim, escreveu sobre as ruas de Curitiba, sobre presidentes de
província e sobejamente escreveu história. Espírito de luz que soube captar nas
entrelinhas do documento a informação apropriada, trazendo à tona o
conhecimento preciso. Transformando a história em delicada arte.
O historiador cria, inventa o cotidiano
histórico a partir de seu olhar aguçado, como dizia o historiador francês, Jacques Revel.
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Jacques Revel:
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História, historica
De dona Marica e o Pedro Marquês,
Quer que eu conte outra vez?
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Jacques Revel:
Entre a história da historiografia...
O livro em questão apresenta uma das mais importantes
análises sobre a história da historiografia. A publicação dos textos de Revel
referenda e complementa determinadas visões consolidadas sobre aquela que foi a
principal matriz historiográfica para os historiadores brasileiros. O livro
pode ser lido como um retrato das diversas "crises" da produção
histórica a partir do final do século passado.
A
proposta levada a cabo, pelos primeiros Annales, de
transformar a história em uma ciência, "também propunha um
positivismo, o marxismo
e o estruturalismo agrupados sob o rótulo de funcionalismo”.
Revel
destaca que os "pais
fundadores" dos Annales
(Marc Bloch e Lucien Febvre) rejeitaram toda construção
teórica e epistemológica que sustentava projeto sociológico durkheimiano. É no
interior dessa perspectiva e da defesa da prevalência da história em relação às
outras ciências sociais que se dá escolha do conceito de "social"
para primeiro plano de investigação histórica: "social
está na medida das ambições ecumênicas e unificadoras do programa".
Autor destaca que, para os primeiros autores dessa
"escola", a história permanece essencialmente empírica, em especial
pelo fato de que o "social não é jamais o objeto de uma conceituação
sistemática, articulada, ele é, sobretudo, o lugar de um inventário, sempre
aberto, de relações que fundam a 'interdependência dos fenômenos”.
Jacques Revel aprofunda esse "novo empirismo" ou
"positivismo crítico" onde o "método" ganha primazia em
detrimento da teoria e das condições de produção históricas.
Porém, desde os anos 70, assiste-se a um conjunto de
interrogações sobre a disciplina e a prática historiográfica levada a cabo a
partir desses pressupostos. Desde então surge uma série de tentativas para se
pensar uma "nova história" do social, crítica e problemática.
O livro História e
historiografia é composto também por três textos publicados
em Um percurso crítico, a saber:
"A instituição e o social", "Máquinas, estratégias e
condutas", "O fardo da memória". Eles apresentam autores e
perspectivas que, do ponto de vista de Revel, ajudam a pensar alternativas à
"crise" da história social: as proposições de Michel de Certeau,
Michel Foucault, Edward Palmer Thompson e Norbert Elias, além da microanálise,
dos jogos de escalas e dos estudos de caso.
Revel, em "Máquinas, estratégias e condutas",
afirma que a maioria dos historiadores está satisfeita com uma leitura redutora
de sua obra. Apesar disso, ou por isso mesmo, seus textos são lidos com
assiduidade e fidelidade pelos historiadores há mais de quarenta anos. Ele
sugere que, ao contrário de um uso que pretende restituir o sentido essencial
do texto Foucault, dever-se-ia "levar em conta o conjunto dos
efeitos, entendidos e mal entendidos que são como a sombra espectral de uma
proposta"..
Nessa direção, não deixa de chamar atenção uma citação de
Siegfried Kracauer no ensaio consagrado a esse autor: "adoro o
lado confuso do pensamento dos historiadores; ele é igualmente exato na medida
em que permanece inacabado".
É bastante interessante também a aproximação que Revel opera
entre as perspectivas de Kracauer e as de Paul Ricoeur, no que se refere à
heterogeneidade e incompletude da narrativa histórica. Um dos pontos altos do
ensaio é a forma como o autor explora, a partir de Kracauer, a homologia entre
história e fotografia.
Revel defende a experimentação da narrativa histórica como
alternativa a esse tipo de história nos dois breves textos que fecham o livro.
O primeiro sobre a questão da biografia; o outro dedicado aos estudos da
memória.
Essa leitura do autor de "A operação
historiográfica" nos ajuda a combater abusos do subjetivismo
contemporâneo, já que para Michel de Certeau a produção histórica é produto de
um lugar essencialmente social. O Certeau de Revel nos recorda que "o
historiador se submete aos imperativos de uma profissão pela qual deve fazer
conhecer e com a qual ele se encontra em negociação constante por tudo que toca
suas maneiras de fazer e de dizer".
A heterogênea coletânea de textos de Jacques Revel nos ajuda
a repensar certos passados e conceitos dominantes e estruturadores da nossa
prática historiadora. Nessa direção, o livro pode contribuir para pensar
questões que o antropólogo brasileiro Eduardo Viveiros de Castro talvez tenha
formulado de forma mais radical: “os conceitos de "social" e
"cultural" ainda têm pertinência? Qual a relevância de uma história]
social ou cultural"? As alternativas para Castro oscilam entre
repensar os adjetivos que acompanham a disciplina ou a elaboração de uma
linguagem conceitual diversa.
Podemos dizer que a presença explícita e implícita de Michel
de Certeau na obra aqui resenhada, contribui para que Revel realize o exercício
de criticar a historiografia dos antecessores e do seu presente para, ao mesmo
tempo, construir espaços e lugares para a emergência do novo. Em especial, por
servir de alerta à tentação que essas subdisciplinas permanentemente vivem
e é considerada, por seus praticantes, a melhor forma de se escrever
história.
Contra essa sedução, os ensaios de Revel sugerem outros
caminhos: a criatividade, a experimentação, o rigor, a erudição, a autocrítica
e a verdade.
História, historica
De dona Marica e o Pedro Marquês,
Quer que eu conte outra vez?
-
Fernando Schinimann <(clic aqui e acesse nosso face)
Adaptação ao Blog do Wille Bathke Junior
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