Nhô Juca gostava por demais de uma roda de chimarrão, pela manhã e no final da tarde, com amigos e vizinhos, sentados nos paus bancos, em roda de um fogo de chão onde a chaleira de ferro fervia a água de preparar o mate quente, em riba das brasas.
Nesses encontros não desprezava ‘um mal feito’ e fazia de um pé de frango, um almoço.
Contava certas coisas e causos estranhos, muitos engraçados, pelo seu modo de falar, ligados a Campo Mourão.
Sem graça ou com graça, ao final ria ou gargalhava de doer a barriga. Aí pedia água e sossegava o pito por umas horas. Tomava mais uma ou duas ‘cuiadas’ e lá vinha outra vez.
"Pois
bem, essa é sem graça, mas aconteceu. Foi quando Campos do Mourão era distrito
de Pitanga. Tinha aqui, um cartorário em nome do titular da Comarca, que
era lá em Guarapuava.
O livrão grosso e preto de registrar os nascidos e
morridos ficava guardado no armário da sua casa, sob custódia de declaração de
fé e conhecimento da grande responsabilidade que tinha assumido. Ficava
chaveado e só a sua mulher tinha cópia da fechadura.
Isso
se passou lá pelos idos de 1930 e ‘caquerada’.
"Pois
bem, essa é sem graça, mas aconteceu. Foi quando Campos do Mourão era distrito
de Pitanga. Tinha aqui, um cartorário em nome do titular da Comarca, que
era lá em Guarapuava.
O livrão grosso e preto de registrar os nascidos e
morridos ficava guardado no armário da sua casa, sob custódia de declaração de
fé e conhecimento da grande responsabilidade que tinha assumido. Ficava
chaveado e só a sua mulher tinha cópia da fechadura.
Isso
se passou lá pelos idos de 1930 e ‘caquerada’.
Ocorreu, nesse tempo, um levante sulista com o caudilho
baixinho, Getulio Vargas, na testa do comando. As tropas getulistas derrubaram
o governo republicano e impuseram a ditadura. Tiraram todo mundo que ocupava
cargos e carguinhos... pelegos e cabides do governo deposto e trocaram pelos
seus seguidores, em sinal de confiança e recompensa ‘pelos bons serviços prestados nos combates’. Era a tal lei da compensação que, aliás, não mudou muito.
Mas ai de quem falasse mal do governo ou criticasse o Getulio.
Era preso e sumiam com o infeliz. Foi o tempo das degolas. Não tinha volta.
Essa pessoa da qual vou me referir agora, sem citar nomes por
meus cuidados, não gostava do Getulio e falava mal do baixinho. Era um safrista
respeitado, de boas posses, tipo coronel, sempre bem aparado, chapéu de feltro
com aba larga marrom... bom cavalo e dois revólveres 38 no
cinturão-guaiaca. Pra matar um, por qualquer coisa, era com ele mesmo e
não precisava muito pra provocar sua ira: bastava olhar torto ou atravessado
pra ele. Nem perguntava: o quê foi?
E lá se ia mais um... ou menos um? – rindo.
E lá se ia mais um... ou menos um? – rindo.
A moda dos getulistas era ter em volta do pescoço, um lenço
vermelho, com nó no gargumilho do gogó. E esse homem brabo não colocava o
lenço-senha de jeito maneira.
Os lideres tementes ao Getulio resolveram, na surdina, dar o
cargo a um companheiro que usasse lenço colorado no pescoço e pertencesse
fielmente ao grupo dos poucos e valentes revoltosos campos mourãoenses.
Escolheram um 'amigo' , formaram a comitiva e foram até a sede
da Comarca, a cavalo, 15 dias de ida e 15 na volta, para passarem o maior carão
e vexame da sua história.
Lá chegando se apresentaram ao juiz – nomeado pelo interventor do Estado. Disseram a que foram e, o indicado ao cargo, junto, todo
faceiro, se achando o bicho da goiaba.
O juiz – vestido de preto longo
básico - convidou-os para adentrarem à sala do Fórum... ordenou que tirassem os
chapéus e se posicionassem silenciosamente à sua frente, em pé, com olhos fixos
nele.
Pediu o nome do cidadão candidato a escrivão, residente nos Campos
do Mourão... mandou o escrivão fazer o termo de posse e compromisso,
tudo na maior pompa. E o pessoal ali, igual estátua.
Estando pronto, dentro dos conformes, o escrivão procedeu a
leitura do termo e o juiz indagou se estavam todos de acordo. A resposta
unânime foi: Sim Senhor, seu Doutor!!
Isto feito chamou o indicado e mandou que assinasse no Livro de
posse... ‘nessa linha aqui’, indicou com a caneta na mão.
Esse homem indicado, se encolheu... afastou da mesa, olhou pra
láa... pra cáa... pra cima... pro chão... (rindo)... ficou ali parado igual
besta empacada, e timidamente balbuciou:
- Doto. Desculpa eu... não sei assiná!!
Um dos amigos dele falou: "assina em cruiz, oras!!
O Juiz visivelmente irritado, esbravejou e quase mandou prender
a turma.
Disse, aos berros, que ‘não aceitava brincadeiras e nem chacotas!
Mass.. doutor.... tentou argumentar alguém ali.
O juiz, brabo, repetiu:
– Nada de mais nem de menos,
cammmbada... sumam daqui e só voltem quando o assunto for sério. Não tenho
tempo a perder!
Não se despediu, nem nada... retirou-se pisando duro, com aquela
roupona preta esvoaçando e os getulistas voltaram encabulados e quase
deram uma coça no ‘escrivão analfabeto’ que veio mudo de Guarapuava aos Campos, enquanto os outros
tagarelavam o tempo todo, sem esquecer o ‘sabão’ que o meritíssimo lhes passou.
Por quê você não falou antes da gente vir, que é tongo, seu
burro?
E o analfa queto... não respondeu.
- E o outro, o rebelde que ficou no Campo?
-Perguntou nho Batista.
- Ele nunca vai ficar sabendo da nossa patriótica tentativa de tirar o livrão
dele.
Os traíras tinham medo da reação e assim continuou escrivão o rebelde sem lenço
vermelho, mesmo!
Vai vendo:
-Depois descobriram que esse também era analfabeto porque alguém da casa dedou a sua mulher. Era Sadona que escrevia naquele livrão e também falseava e assinava o nome do Zébedeu. Pode? - e riu sacolejando a pança.
-Depois descobriram que esse também era analfabeto porque alguém da casa dedou a sua mulher. Era Sadona que escrevia naquele livrão e também falseava e assinava o nome do Zébedeu. Pode? - e riu sacolejando a pança.
Nhô Juca terminou o
causo, mas ninguém reagiu. Só ele.
Por quê será, hein compadre Juca ?!
Eu sei porque? disse
compadre José:
Que arrematou: Porque é sem graça
mesmo. Isso é coisa séria!
Mas valeu o registro que agora entra oficialmente em nossa rica história mourãoense.
Caiu na internet é de domínio público e não se apaga jamais, neh?
Pois eh seo Zé...
até a próxima, se Deus qui zé !!
}{
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