09/06/2011



Canção do Tamoio - lição de vida - Gonçalves Dias nos relata o fato de um pai, de uma tribo de índios tamoios que povoavam a Guanabara de Pindorama, em São Sebastião do Rio de Janeiro. Mostra ao filho recém-nascido a imagem ideal de um verdadeiro herói, durante o massacre de Portugal aos nativos que viviam em paz na Terra Brasilis.

 
I
Não chores, meu filho:
Não chores, que a vida
É luta renhida:
Viver é lutar.
A vida é combate,
Que os fracos abate,
Que os fortes, os bravos,
Só pode exaltar.

II
Um dia vivemos!
O homem que é forte
Não teme da morte;
Só teme fugir;
No arco que entesa
Tem certa uma presa,
Quer seja tapuia,
Condor ou tapir.

III
O forte, o cobarde
Seus feitos inveja
De o ver na peleja
Garboso e feroz;
E os tímidos velhos
Nos graves concelhos,
Curvadas as frontes,
Escutam-lhe a voz!

IV
Domina, se vive;
Se morre, descansa
Dos seus na lembrança,
Na voz do porvir
Não cures da vida!
Sê bravo, sê forte!
Não fujas da morte,
Que a morte há de vir!

V
E pois que és meu filho,
Meus brios reveste;
Tamoio nasceste,
Valente serás.
Sê duro guerreiro,
Robusto, fragueiro,
Brasão dos tamoios
Na guerra e na paz.

VI
Teu rito de guerra
Retumbe aos ouvidos
D'inimigos transidos
Por vil comoção;
E tremam d'ouvi-lo
Pior que o sibilo
Das setas ligeiras,
Pior que o trovão.

VII
E a mãe nessas tabas,
Querendo calados
Os filhos criados
Na lei do terror;
Teu nome lhes diga,
Que a gente inimiga
Talvez não escute
Sem pranto, sem dor!

VIII
Porém se a fortuna,
Traindo teus passos,
Te arroja nos laços
Do inimigo falaz!
Na última hora
Teus feitos memora,
Tranqüilo nos gestos,
Impávido, audaz.

IX
E cai como o tronco
Do raio tocado,
Partido, rojado
Por larga extensão;
Assim morre o forte!
No passo da morte
Triunfa, conquista
Mais alto brasão.

X
As armas ensaia,
Penetra na vida:
Pesada ou querida,
Viver é lutar.
Se o duro combate,
Os fracos abate,
Aos fortes, aos bravos,
Só pode exaltar.




Gonçalves Dias

Uma das habilidades que mais nos chama a atenção nesses poemas é resultado agradável do uso da métrica. Gonçalves Dias geralmente aplicava a ténica de quatro a seis sílabas em seus versos. Vemos isso claramente no poema a seguir. Leia em voz  e perceba, de fato, o que diz:


O canto do guerreiro

I

Aqui na floresta
Dos ventos batida,
Façanhas de bravos
Não geram escravos,
Que estime a vida
Sem guerra e lidar.
— Ouvi-me, Guerreiros.
— Ouvi meu cantar.

II
Valente na guerra
Quem há, como eu sou?
Quem vibra o tacape
Com mais valentia?
Quem golpes daria
Fatais, como eu dou?
— Guerreiros, ouvi-me;
— Quem há, como eu sou?

III
Quem guia nos ares
A flecha implumada,
Ferindo uma presa,
Com tanta certeza,
Na altura arrojada,
Onde eu a mandar?
— Guerreiros, ouvi-me,
— Ouvi meu cantar.

IV
Quem tanto imigos
Em guerras preou?
Quem canta seus feitos
Com mais energia?
Quem golpes daria
Fatais, como dou?
— Guerreiros, ouvi-me.
— Quem há, como eu sou?

V
Na caça ou na lide,
Quem há que me afronte?!
A onça raivosa
Meus passos conhece,
O imigo estremece,
E a ave medrosa
Se esconde no céu.
— Quem há mais valente,
— Mais destro do que eu?

VI
Se as matas estrujo
Co’ os osons do Boré.
Mil arcos se encurvam,
Mil setas lá voam,
Mil gritos reboam,
Mil homens de pé
Eis surgem, respondem
Aos sons do Boré!
— Quem é mais valente,
— Mais forte quem é?

VII
Lá vão pelas matas;
Não fazem ruído:
O vento gemendo
E as matas tremendo
E o triste carpido
Duma ave a cantar
São eles — guerreiros,
Que faço avançar.

VIII
E ao Piaga se ruge
No seu Maracá,
A morte lá paira
Nos ares frechados,
Os campos juncados
De mortos são já:
Mil homens viveram
Mil homens são lá.

IX
E então se de novo
Eu toco o Boré;
Qual fonte que salta
De rocha empinada,
Que vai marulhosa,
Fremente e queixosa,
Que a raiva apagada
De todo não é,
Tal eles se escoam
Aos sons do Boré,
— Guerreiros, dizei-me,
— Tão forte quem é?











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