21/03/2019

* Caminho do Peaberu em poesia por Campo Mourão


Pe abe y u em poesia 
(autor: Fernando Carreiro Albuquerque)

Ignorante fado enfuna
velas de um vago Bojador
a obsessão vulgar da fortuna
ordem do infante navegador.

Navegou louca ganância
de pés secos, nunca à bordo,
sonhos, mares de abundância
de dores, espectro sórdido.

De ponta sagrada pois erma
debruçou-se, acuado baco
enebriado de alma enferma
devaneio místico oceânico.

Era a compulsão da conquista
a lança primeiro fremia
num furor escravagista 

tudo era assolado à histeria.

Luz de Ceuta doura e linda
faz a negra aura iluminada
Dom Henrique trama a senda
Ter Tânger dilapidada.

Parvo e tosco mundo cristão 
desafiou o mar tenebroso 
flanco oculto, orgulho do Islão 
tórrido elo bonançoso.

Aspirou povos sem maldades
engoliu culturas altivas
bafejou pelos arrabaldes
vomitou em plagas nativas.

O espírito desbravador
tão altaneiro e truculento,
inato engenhoso empreendedor
ceifa ondas contra frio vento.

Décadas depois, Dom Manoel
afetado por sacro miasma
dos lucros, fez sair barinel,
em busca de rico fantasma.

Nave barinel, vetusta
redondo, redonda vela,
barcha transmutada, astuta
daí a ciência fez caravela.

Por anos a fio arranhavam as costas
da senda tropical , Brasil...
uma terra de peles tostas
D'homens largados à sorte vil.

Caboto então cabotava,
desovava degredados
que entre índios se abrigava
cada um destes desterrados.

Então a lenda criou corpo. adensado 
o rei branco, prateadas serras 
copo de ouro e de joia ornado 
com neve eterna em altas terras.

Os charruas e carijós diziam
Já apontavam os tupiniquins
Terra adentro olhos se perdiam
Além dos picos, campos e afins.

O Rio Paraná era o caminho
Após salvo cruzar delta-mar
Rio da Prata num bergantinho
ao oeste o rumo certo tomar.

Mas zelosos, ainda, os deuses
do povo inca tão pulcro e baio
fez esconder entre brumas e fozes
o caminho pelo rio Pilcomayo.

Doutro lado Aleixo Garcia,
numa apoteose inaugural
quase dois mil índios aliciaria,
criando nosso carnaval;

Deixaram a baía dos Patos
rumo firme ao rio Itapocu,
subiram seus vales e matos
e safos alcançarem o Peaberu.

Dali em trilha bem marcada
orientados para sudoeste
três espigões vindo em seguida
fizeram viagem inconteste.

Ponta Grossa e redondezas
para a direita as gargantas
do Guartelá e alterosas
Campos Gerais, terras santas.

Belo de fato o rio Ivaí
transpôs-se-lhe pela nascente,
havendo ficado, o Tibagi,
Se fez o rio Piquiri ao poente.

Restando apenas o Iguaçu,
Passa-lhe perto da sua foz,
Num capricho do Peaberu
Sem ver a grande queda feroz.

Adentrando pelo vil Chaco 
o rio Paraguai atravessando 
a excursão seguia para Cusco 
fez-se aos postos de Sucre;

Lá, intrépidos, saquearam os incas,
aparvalhados pelo ataque,
ouro e prata trouxeram em pencas
do reinado de Huayna Capac.

Mas do séquito arrojado 
Que aos portões de Cusco chegou 
apenas um gentio estropiado 
à baía dos Patos alcançou.

Ao voltar pelo rio Paraguai,
os vulgos piratas das monções
chamados os da tribo Payaguá
dizimaram os incautos rufiões.

A lenda da serra de prata,
do rei branco milionário,
fez-se febre quase imediata
aos cavalheiros do templário.

Mas o mito logo se esfarelou
pois do inicial alvoroço
a chã vereda não mais se achou
ao Peaberu fez-se omisso.

Hernan Cortez à Vera Cruz finca
desvenda as serras de prata,
incendeia vil o império Inca
da gana vítima inata.

Ver Potosi posse espanhola, 
sendo ingrata a rude senda 
às estas terras  não deu-se bola, 
por muito o Brasil foi lenda.

***
Hoje revendo a trilha do Peaberu 
Remonto ser ela ainda ativada 
Levando da Serra do Mar ao Iguaçu 
Serpenteia linda, xucra, asfaltada.

Sai de Piçarras, foz do Itapocu,
Sobe a Serra do Mar a Ponta Grossa,
daí segue para oeste até Foz do Iguaçu
Na qual ergueu-se "Vila muy Hermosa".

Para Cabeça de Vaca , espanhol louco,
restou o prêmio: achar a foz monumental,
do rio Iguaçu, mas não evitou tampouco,
que fosse também de Portugal.

Já percorri todos estes caminhos,
insanos, mágicos, mesmo hoje,
as araucárias repletas de pinhos,
veloz cruzo os campos na laje.

Só assim consigo compreender o fato:
ridículo nos pareça  até então
bem risíveis sejam as desventuras,
o porte da aventura, destes homens sem porto.


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